PGFN regulamenta dispensa de garantia em ações judiciais: Entenda os impactos da portaria N° 95/2025.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) publicou recentemente a Portaria nº 95/2025, regulamentando a dispensa de garantia em processos judiciais que questionam decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) tomadas por voto de qualidade. Essa medida busca trazer maior segurança jurídica e simplificar o acesso ao Judiciário para contribuintes que se enquadrem nos critérios estabelecidos.

A portaria surge em cumprimento à Lei nº 14.689/2023, que reintroduziu o voto de qualidade no Carf, mecanismo de desempate em que o presidente da turma julgadora, representante da Fazenda Nacional, decide a questão. Embora o voto de qualidade tenha sido objeto de críticas, a lei também trouxe facilidades para os contribuintes, como a possibilidade de questionar judicialmente essas decisões sem a necessidade de oferecer garantia, desde que possuam capacidade de pagamento.

A Importância da Regulamentação

Antes da edição da Portaria nº 95, mesmo com a previsão legal de dispensa de garantia, havia resistência por parte da Fazenda Nacional em aceitar ações judiciais sem garantias devido à ausência de regulamentação. Isso levou a um aumento de litígios no Judiciário, onde juízes, frequentemente, decidiam a favor dos contribuintes.

Com a nova portaria, a dispensa de garantia passa a ser regulamentada como uma opção facultativa, permitindo que os contribuintes escolham entre apresentar garantias tradicionais ou se beneficiar da dispensa, desde que preencham os requisitos estabelecidos.

Capacidade de Pagamento: O Principal Foco de Atenção

Um dos pontos centrais da regulamentação é o critério de capacidade de pagamento. A portaria define que a capacidade será avaliada com base no “patrimônio líquido realizável ajustado” da empresa, um conceito que vai além do patrimônio líquido tradicional.

Especialistas apontam preocupações sobre como esse cálculo será realizado. Há o receio de que ativos avaliados a valor justo sejam reduzidos no critério ajustado, diminuindo artificialmente o patrimônio líquido e inviabilizando a dispensa da garantia para alguns contribuintes.

Maria Raphaela Matthiesen, tributarista da Mannrich & Vasconcelos, destaca que a ausência de regulamentação detalhada sobre o cálculo pode gerar novos litígios judiciais, especialmente se os contribuintes conseguirem demonstrar que o método utilizado pela PGFN os prejudicou.

Outras Inseguranças e Possíveis Impasses

A portaria também deixa dúvidas em relação ao prazo de análise do requerimento de dispensa de garantia, estipulado em até 30 dias. Durante esse período, há incerteza sobre como será tratada a regularidade fiscal do contribuinte, especialmente em situações que exijam comprovação imediata.

Outro ponto controverso está no artigo 7º, que trata das possibilidades de revogação da dispensa de garantia. Não está claro se a revogação dependerá de decisões judiciais transitadas em julgado ou se poderá ocorrer com base em decisões ainda pendentes de recurso. Essa lacuna pode gerar instabilidade para as empresas, especialmente em casos de discussão tributária prolongada.

Além disso, a portaria não aborda explicitamente a possibilidade de aplicação retroativa da dispensa para processos em andamento. Empresas que já ofereceram garantias tradicionais podem buscar a substituição por meio de pedidos judiciais, aumentando o volume de litígios relacionados ao tema.

Impactos para os Contribuintes e Setores Beneficiados

Apesar das incertezas, a regulamentação é vista como um avanço. Segundo Maria Rita Ferragut, sócia de tributário do Trench Rossi Watanabe, a norma traz maior previsibilidade para os contribuintes, eliminando a insegurança que vigorava desde a edição da lei em 2023.

Empresas de setores como tecnologia, agronegócio e financeiro, que frequentemente possuem alta movimentação financeira, mas patrimônio líquido reduzido, podem se beneficiar da flexibilização, especialmente pela possibilidade de combinar diferentes formas de garantia, conforme previsto no artigo 3º da portaria.

Decisões no Carf e o Cenário Atual

Embora as decisões por voto de qualidade representem apenas uma pequena parcela do total no Carf – 3,7% em 2024 –, elas envolvem valores significativos. Em 2024, dos R$ 753 bilhões discutidos no Carf, R$ 139 bilhões estavam vinculados a processos decididos por voto de qualidade.

A regulamentação da dispensa de garantia busca reduzir os conflitos judiciais decorrentes dessas decisões, mas seu impacto dependerá de como os critérios serão aplicados na prática.

O Papel da Advocacia Especializada

A nova portaria reforça a importância de um acompanhamento jurídico especializado para empresas que desejam se beneficiar da dispensa de garantia ou enfrentar litígios tributários. A análise criteriosa dos requisitos, do cálculo de patrimônio líquido ajustado e das possibilidades e contestação é essencial para proteger os interesses dos contribuintes.