Aguardados pelo setor empresarial, os projetos de Refis andaram pouco no Congresso Nacional no último ano. A maioria das propostas está em etapas preliminares de tramitação, e diante da longevidade da crise econômica ocasionada pela Covid-19, empresas alertam da necessidade urgente de melhores condições para o pagamento de tributos. No entanto, segundo fontes consultadas pelo JOTA, existe certa resistência do Executivo federal de abrir mão de tributos devido à crise fiscal que o país atravessa. Atualmente são pelo menos nove projetos de lei que instituem parcelamentos fiscais de tributos federais, que tramitam tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados. A maioria das propostas tem como justificativa a crise econômica gerada pela pandemia da Covid-19.
Na análise de especialistas consultados pelo JOTA, a aprovação de um Refis em 2021 será essencial para atenuar a crise econômica gerada pela pandemia da Covid-19 e alongada pela dificuldade do governo federal em controlar os efeitos sanitários, sociais e econômicos da doença. Para os especialistas, há chances de aprovação de algum Refis de tributos federais, não só pelas novas medidas restritivas de circulação de pessoas, fechamento de atividades empresariais e queda na atividade econômica, como pela composição da nova presidência da Câmara dos Deputados, uma vez que o chamado “centrão”, do qual Arthur Lira faz parte, costuma ser simpático a esse tipo de matéria.
Parte dos projetos ainda está na fase de despacho, aguardando processamento da Câmara dos Deputados e do Senado. O PL 2735/2020, do deputado Ricardo Guidi (PSD-SC), é uma das propostas mais adiantadas porque foi aprovada urgência para apreciação da proposição. Dessa forma, o ritmo de votação vai depender de acordo de lideranças. Segundo dados da ferramenta Aprovômetro, do JOTA, o projeto tem 14,9% de chances de aprovação. Designado relator do PL 4728/2020 – de reabertura do prazo de adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária (PERT) – no Senado, o líder do governo Fernando Bezerra (MDB-CE) iniciou as conversas com os colegas na reunião de líderes desta quinta-feira (18/3). Segundo o líder da minoria, Jean Paul Prates (PT-RN), o emedebista “tocou no assunto” e com isso foi dada a largada para elaboração de emendas e articulação pelo novo Refis.
“Ainda não tem acordo, foi mencionado pela primeira vez hoje. Mas essas coisas você sabe como é… falam uma primeira vez, conversa de novo na semana seguinte, e de novo até que falam ‘vamos votar porque já discutimos’. Não houve decisão de pautar projeto nenhum ainda, mas entrou no radar”, disse o petista. Ainda não há acordo, mas há vontade do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), autor da proposição. Como as conversas ainda estão em estágio inicial, o Aprovômetro do JOTA prevê 2,1% de chances de aprovação da proposta.
Parcelamento em até 360 meses e anistias
De uma forma geral, os projetos buscam trazer alívio de caixa para as empresas e manutenção dos negócios e dos empregos. As propostas de parcelamento trazem premissas similares: uma entrada inicial, parcelas variando de 60 a 360 meses e anistias de multa entre 70% e 100%. A redução nos juros vai de 45% a 100%. Alguns projetos também permitem a utilização de saldo negativo de CSLL e prejuízo fiscal, o que, na análise de especialistas consultados pelo JOTA, é importante para que as empresas quitem as dívidas tributárias sem mexer no fluxo de caixa. O PL 3345/2020, de autoria do deputado Ruy Carneiro (PSDB-PB), traz uma peculiaridade: a parcela a ser paga pelo contribuinte será calculada com base no valor correspondente a 1% da receita bruta mensal da empresa.
Na análise de João Marcos Colussi, sócio da área de Tributário do escritório Mattos Filho, os projetos de Refis são necessários ao país e são medidas de inteligência fiscal. Para ele, as propostas em discussão no Congresso Nacional podem ajudar a economia brasileira. “Mais do que nunca o Brasil precisa de dinheiro na economia, mais do que nunca vemos que o governo gasta mal, administra mal e contrata mal”, afirma. No entanto, Colussi acredita que ainda poderiam avançar mais projetos que permitissem a quitação das dívidas tributárias por meio de precatórios. Segundo ele, há arcabouço legal para isso.
Para Colussi, não há um excesso de Refis no Brasil. “Essas críticas [ao excesso de Refis no Brasil] estão fora do contexto. O que existe no Brasil é um excesso de exigência de tributos e um excesso de complexidade no sistema que leva o empresário brasileiro e mesmo a pessoa física à inadimplência, porque é impossível que se cumpra todas as exigências principais e acessórias sem qualquer tipo de falha”. Os programas de parcelamento recebem críticas de especialistas que alegam que a medida poderia fomentar a inadimplência. De acordo com o posicionamento, seria vantajoso não pagar tributos e esperar por um Refis para regularizar a situação.
Devido à grave situação econômica que o país se encontra, até mesmo a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco), que sempre se posicionou contrária ao excesso de Refis e privilégios tributários no Brasil, vem se mostrando sensível à possibilidade de melhores condições para o pagamento de tributos por empresas atingidas pela crise da Covid-19. O presidente da Unafisco, Mauro Silva, acredita que um Refis pode ocorrer por conta da pandemia da Covid-19. No entanto, ele pondera que o parcelamento deve ter parâmetros, como, por exemplo, foco em setores que estão realmente prejudicados, benefício restrito ao período de duração da pandemia e vinculação do parcelamento e anistias à contrapartidas, como a manutenção de empregos.
“Quando se refere a setores prejudicados pela pandemia é preciso um olhar mais condescendente, menos crítico. No entanto, os Refis não devem abranger dívidas tributárias que não são do período da pandemia e não devem privilegiar setores que estão lucrativos, como o setor financeiro, de plano de saúde, agronegócio e de alimentos. O foco deve ser em setores prejudicados, como os de eventos e diversão”.
Transações tributárias
Além dos PLs, as empresas têm a saída de aderir às transações tributárias abertas pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Uma delas começou em 1º de março e vai até 30 de junho, abarcando dívidas tributárias vencidas no período de março a dezembro de 2020 e não pagas por conta da pandemia causada pela Covid-19 – o fisco espera negociar R$ 1,2 bilhão até o fim do prazo de adesão. A outra transação reaberta pela PGFN é o Programa de Retomada Fiscal, que permite a entrada de contribuintes em transações tributárias, com o pagamento de dívidas em até 142 meses. O órgão também trouxe uma novidade relevante ao prever, pela primeira vez, o parcelamento de débitos de empresas em recuperação judicial. O prazo de adesão se iniciou na segunda-feira (15/3) e fica disponível até 30 de setembro de 2021.
Para Diana Piatti Lobo, sócia da área de tributário do escritório Machado Meyer, neste momento de crise econômica gerada pela pandemia da Covid-19 o Refis é mais abrangente que as transações tributárias disponíveis. “A transação, de uma maneira geral, é mais limitada [do que um Refis]. Hoje, temos a transação para dívida para o grupo de baixa recuperabilidade, e a transação de pequeno valor. A baixa recuperabilidade não tem a ver com Covid. Alguns editais da PGFN até têm esse vínculo com a pandemia, mas o foco não é esse”, explica.
Fonte: JOTA